quinta-feira, 29 de maio de 2008

I Fórum: Proseando sobre a construção de textos e ilustração


O encontro desta semana foi especial. A Distribuidora Arco-Íris,em parceria com a EAPE,promoveu o "Grande Encontro" dos escritores Jonas Ribeiro e André Neves com os professores tutores e cursistas dos módulos I e II do curso Alfabetização e Linguagem,no auditório da Igreja Sara Nossa Terra,Setor Sudoeste.
Breno,um jovem contador de histórias integrante do grupo da professora Terezamaria,iniciou brilhantemente o evento com a apresentação dum trecho do livro "A caligrafia de Dona Sofia" de André Neves.Uma produção de texto inspirada na personagem Bruxa Cremilda das histórias de Jonas Ribeiro também foi apresentada por uma criança na abertura.
A "prosa" descontraída entre os autores e o público iniciou-se com o relato sobre a parceria escritor e ilustrador que existe há 11 anos.André Neves destacou a importância da relação de afeto entre autor,ilustrador e texto como facilitadora na composição do projeto visual do obra.A importância do livro infantil como "Literatura para a Infância" da criança e do adulto que fora criança foi bastante enfatizada por eles.
A dupla demonstrou a satisfação de prosear com um grupo especificamente docente e,aproveitando a oportunidade,falou sobre o trato dado à literatura em sala de aula.O professor,segundo eles,deve preservar a "essência da palavra" do escritor ao contar histórias aos alunos.Também o trabalho com as imagens deve extrapolar a simples releitura (reprodução) de desenhos.
Como o escritor e o contador de histórias "fazem parte de um mesmo amálgama",segundo costuma falar,Jonas nos presenteou com a contação de Faniquito e siricutico no mosquito,Um bifinho ou um salaminho?, A visita da saudade e A cor da fome.
O ilustrador André Neves,por problemas operacionais,não pôde apresentar suas imagens para o grande público,mas,em contrapartida,interpretou de forma encantadora, com seu sotaque nordestino,um poema de Zé da Luz intitulado As Flô de Puxinanã.
E assim aconteceu o nosso Grande Encontro com o humor,a irreverência,a criatividade,a sensibilidade e, sobretudo,com a arte.
Querem mais?Visitem o website http://www.jonasescritor.com.br/ e o blog http://confabulandoimagens.blogspot.com/ .

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Asa Branca... "outros olhares"


No 5º Encontro com os professores- cursistas de Santa Maria analisamos a música "Asa Branca" de Luiz Gonzaga,com o objetivo,além da interpretação,de refletirmos sobre as variações linguísticas,os fenômenos decorrentes destas variações e,em especial,o dialeto representativo do falante nordestino.Tudo teria transcorrido dentro da normalidade e de acordo com a análise que nós tutores vivenciamos no CFORM/UNB se...

Durante a etapa de planejamento do encontro,descobri em meu acervo musical um CD de Luiz Gonzaga ao Vivo,cuja "Asa Branca" era cantada em outra variante mais aproximada da variedade-padrão.Achei estranhíssimo,principalmente porque era o próprio (Luiz) quem cantava.No mesmo CD,na sequência,o cantor entoa a canção "O Retorno da Asa Branca" e retoma a variedade não-padrão característica da versão original de "Asa Branca".Isto proporcionou reflexões bastante interessantes sobre as variantes,inclusive as de prestígio,e sobre o preconceito linguístico.

Uma hipótese levantada por um cursista foi a de que,em "Asa Branca" o contexto sócio- cultural é a cidade grande,possivelmente São Paulo,que foi e é a rota migratória de muitos nordestinos que saem de sua terra natal em busca de melhores condições de vida.E,neste novo contexto, há a absorção, como forma de resistência,de uma outra cultura,inclusive linguística.Mas,ao primeiro sinal de chuva no sertão,o homem nordestino retorna à terra natal,reencontra os "seus" e recupera sua identidade,inclusive no modo de falar.

Também a análise interpretativa de outra professora foi bem significativa, porque a mesma nasceu e morou,quando criança,no interior nordestino,tendo vivido todos os dramas da seca.Percebemos ,nesta outra análise, o quanto o conhecimento e a leitura de mundo contribuem para o enriquecimento da interpretação textual e o quão é importante a cumplicidade sujeito-produtor/sujeito-leitor,pois oportuniza novos "olhares" à obra.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

ENCONTROS

ENCONTROS ... palavra perfeita para definir a minha prática de tutoria.
O 1º Encontro foi a superação do medo,da preocupação e da ansiedade para assumir a tutoria do curso "Alfabetização e Linguagem".Contudo,já no contacto inicial com os professores-cursistas de Santa Maria percebi o quão enriquecedora e gratificante seria esta prática.A dinâmica "Marcos Profissionais" oportunizou relatos de histórias,trajetórias de vida que nos constituíam nos professores que hoje somos.Percebemos que diante de tanta heterogeneidade,alguns "nós" se entrelaçavam, se encontravam tornando-nos iguais.
Nas semanas seguintes nos encontramos com teorias e concepções linguísticas,sociolinguísticas e psicolinguísticas que suscitaram reflexões acerca da nossa práxis enquanto professores de língua materna.Percebemos que a teoria,em muitos momentos,ia de encontro com essa prática.Desencontros?Que nada!
A cada novo encontro um "olhar de professor- pesquisador" (re) nasce...

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Sobre a origem da poesia

A origem da poesia se confunde com a origem da própria linguagem.Talvez fizesse mais sentido perguntar quando a linguagem verbal deixou de ser poesia. Ou: qual a origem do discurso não-poético, já que, restituindo laços mais íntimos entre os signos e as coisas por eles designadas, a poesia aponta para um uso muito primário da linguagem, que parece anterior ao perfil de sua ocorrência nas conversas, nos jornais, nas aulas, conferências, discussões, discursos, ensaios ou telefonemas.Como se ela restituísse, através de um uso específico da língua, a integridade entre nome e coisa — que o tempo e as culturas do homem civilizado trataram de separar no decorrer da história.A manifestação do que chamamos de poesia hoje nos sugere mínimos flashbacks de uma possível infância da linguagem, antes que a representação rompesse seu cordão umbilical, gerando essas duas metades — significante e significado.Houve esse tempo? Quando não havia poesia porque a poesia estava em tudo o que se dizia? Quando o nome da coisa era algo que fazia parte dela, assim como sua cor, seu tamanho, seu peso? Quando os laços entre os sentidos ainda não se haviam desfeito, então música, poesia, pensamento, dança, imagem, cheiro, sabor, consistência se conjugavam em experiências integrais, associadas a utilidades práticas, mágicas, curativas, religiosas, sexuais, guerreiras?Pode ser que essas suposições tenham algo de utópico, projetado sobre um passado pré-babélico, tribal, primitivo. Ao mesmo tempo, cada novo poema do futuro que o presente alcança cria, com sua ocorrência, um pouco desse passado.Lembro-me de ter lido, certa vez, um comentário de Décio Pignatari, em que ele chamava a atenção para o fato de, tanto em chinês como em tupi, não existir o verbo ser, enquanto verbo de ligação. Assim, o ser das coisas ditas se manifestaria nelas próprias (substantivos), não numa partícula verbal externa a elas, o que faria delas línguas poéticas por natureza, mais propensas à composição analógica.Mais perto do senso comum, podemos atentar para como colocam os índios americanos falando, na maioria dos filmes de cowboy — Eles dizem "maçã vermelha", "água boa", "cavalo veloz"; em vez de "a maçã é vermelha", "essa água é boa", "aquele cavalo é veloz". Essa forma mais sintética, telegráfica, aproxima os nomes da própria existência — como se a fala não estivesse se referindo àquelas coisas, e sim apresentando-as (ao mesmo tempo em que se apresenta).No seu estado de língua, no dicionário, as palavras intermediam nossa relação com as coisas, impedindo nosso contato direto com elas. A linguagem poética inverte essa relação pois vindo a se tornar, ela em si, coisa, oferece uma via de acesso sensível mais direto entre nós e o mundo.Segundo Mikhail Bakhtin, (em "Marxismo e Filosofia da Linguagem") "o estudo das línguas dos povos primitivos e a paleontologia contemporânea das significações levam-nos a uma conclusão acerca da chamada 'complexidade' do pensamento primitivo. O homem pré-histórico usava uma mesma e única palavra para designar manifestações muito diversas, que, do nosso ponto de vista, não apresentam nenhum elo entre si. Além disso, uma mesma e única palavra podia designar conceitos diametralmente opostos: o alto e o baixo, a terra e o céu, o bem e o mal, etc". Tais usos são inteiramente estranhos à linguagem referencial, mas bastante comuns à poesia, que elabora seus paradoxos, duplos sentidos, analogias e ambiguidades para gerar novas significações nos signos de sempre.Já perdemos a inocência de uma linguagem plena assim. As palavras se desapegaram das coisas, assim como os olhos se desapegaram dos ouvidos, ou como a criação se desapegou da vida. Mas temos esses pequenos oásis — os poemas — contaminando o deserto da referencialidade.
Arnaldo Antunes